Por Carol Gonçalves
Uma das atividades que fazem parte da rotina dos hospitais é o banho do paciente. Não há como negar a sensação de bem-estar e conforto que ele gera, sem falar na remoção de sujidades causadoras de doenças e infecções, oferecendo melhora biofuncional, além de fortalecer a autoimagem, extremamente importante para aqueles que estão em situação vulnerável.
Mesmo quando a situação é grave e o paciente não pode se levantar, o banho está entre os cuidados diários e pode ser dado no leito, afinal, como explica Cristiane Resende, gerente de Enfermagem das Unidades de Terapia Intensiva da Beneficência Portuguesa de São Paulo (SP), é também uma questão de cultura. “Os parentes dos pacientes sempre perguntam: ele não vai tomar banho hoje? Já é algo enraizado no Brasil”, conta.
Mas essa atividade precisa ser muito bem avaliada e planejada pelos enfermeiros para não causar mais danos à saúde do indivíduo. A primeira pergunta é: qual sua situação clínica? Porque, em algumas situações de gravidade, a higienização completa não é aconselhada. No caso de cirurgias cardíacas, por exemplo, não é recomendado nas primeiras quatro horas após o procedimento.
Cristiane diz que as UTIs mais modernas possuem banheiro com chuveiro, para que o próprio paciente, se possível, possa tomar banho com privacidade, em pé ou sentado. O uso da banheira não é recomendado devido à contaminação da água por sujidades da pele e secreções que podem passar para outras áreas do corpo. Em se tratando de bebês, é preciso desinfetar a banheira com produtos adequados.
O tipo de sabonete também é importante, pois o pH deve estar de acordo com a pele para não retirar a proteção natural e abrir caminho para infecções. São indicados os sabonetes neutros líquidos ou toalhas com soluções umectantes. Relacionado à temperatura ambiente nas UTIs, o ideal é manter entre 21°C e 24°C.
A gerente de Enfermagem lista os principais cuidados que os profissionais precisam ter para executar essa atividade:
- Técnica: o banho deve obedecer ao sentido cefalocaudal, deixando para a última etapa as partes íntimas e a região anal.
- Risco de hipotermia: evitar que o paciente permaneça exposto a baixas temperaturas, por isso todo o processo deve ser feito no máximo em 20 minutos, pois o frio pode ser prejudicial ao quadro clínico.
- Risco de infecções: deve-se usar materiais de uso individual, preferencialmente produtos descartáveis. Nunca reutilizar a água da bacia que esteja com sujidade de substâncias orgânicas para lavar outra parte do corpo.
- Dispositivos: o profissional precisa atentar-se a cateteres, drenos, sondas e cânulas de intubação inseridos no paciente, principalmente na UTI, para não movê-los ou retirá-los na hora da higienização.
- Instabilidade da respiração: o enfermeiro deve avaliar as condições respiratórias associadas ao exame de raios-X do tórax do paciente, para saber se ele possui atelectasia ou infiltrado pulmonar difuso. Os que tiverem essas alterações devem ser mobilizados durante o banho sempre do lado contrário ao pulmão comprometido.
- Risco de quedas: é importante realizar a avaliação das condições psicomotoras do paciente, como agitação, confusão mental, nível de sedação e superfície corpórea. O paciente necessita estar calmo e a equipe assistencial preparada para não realizar movimentos bruscos e garantir a movimentação do paciente com segurança (atenção especial aos obesos). As camas devem ter travas nas rodas e grades para diminuir o risco de queda.
Estão disponíveis no mercado equipamentos portáteis para facilitar o banho no leito, que possuem reservatório para água e sabonete, controle da temperatura da água e funcionam com energia elétrica.
A seguir, hospitais detalham o processo de higienização dos pacientes com mobilidade reduzida e os diferenciais oferecidos a eles e aos seus acompanhantes para garantir conforto e bem-estar durante a estada na instituição.
ATENDIMENTO E HOSPITALIDADE
No Hospital Santa Joana, de Recife (PE), cada paciente tem o seu material de higiene individualizado. A gerente assistencial multidisciplinar, Maria de Fatima Sampaio da Cunha, explica que a rotina do banho varia de acordo com a gravidade do caso. “Quando se trata de um paciente em UTI, os equipamentos e itens de higiene, os lençóis que serão trocados e a toalha para secá-lo são colocados em uma mesa auxiliar”, detalha.
Segundo ela, alguns produtos facilitam bastante os banhos no leito e minimizam sua duração, como toucas com xampu que não necessitam água adicional e luvas com produtos de higiene. “Infelizmente, eles não são pagos pelos planos de saúde e muitas vezes a família do paciente não arca com o custo adicional”, expõe.
Antes do seu início, são observados todos os equipamentos de monitoramento e soros que estão sendo infundidos, pois o tratamento precisa continuar durante o banho, exceto a dieta por sonda, que deve ser pausada. Maria de Fatima lembra que é muito importante observar e manter o decúbito no mínimo a 30 graus. Normalmente, para cada paciente acamado, são necessários dois técnicos de enfermagem e, se a situação for muito grave, a higienização é parcial e acontece com supervisão direta do enfermeiro.
No momento do banho há também a limpeza do colchão com material desinfetante: na mobilização do paciente e antes de colocar o novo enxoval. São realizados até dois banhos completos e seis higienes de genitália, a cada troca de fralda.
Para a limpeza oral dos pacientes intubados e/ou comatosos, são utilizadas espátulas e gases embebidas em antisséptico. “Também existem no mercado alguns bastonetes de material maleável que já têm o produto e facilitam o processo”, acrescenta.
Já a higiene do pavilhão auricular externo é feita normalmente no banho, com compressas de celulose. O Santa Joana não utiliza cotonetes para evitar lesão do ouvido interno, seguindo normas de procedimento operacional padrão.
A gerente explica que a técnica do banho no leito inclui o asseio da genitália, higienizada por último sempre de forma unidirecional, trocando as compressas em cada área a ser lavada. É utilizado o mesmo sabonete do banho.
Todos os apartamentos de pacientes acamados e com risco para formação de úlcera por pressão possuem colchão de ar pneumático, que diminui as tensões nas áreas de saliências ósseas, como região sacral, trocantérica e maléolos. “Há também uma rotina de troca de decúbito, que não deve ultrapassar três horas. Fazemos acompanhamento, ainda, da fisioterapia motora, para correção de posicionamento e trabalho da musculatura”, acrescenta.
Com relação aos lençóis, Maria de Fátima salienta que eles não devem ser feitos de tecidos ásperos, precisam ser mantidos secos e sem dobraduras. A utilização de travessas é fundamental para evitar as lesões por fricção e cisalhamento da pele provocados pelos movimentos nas mudanças de decúbito.
A equipe também é instruída a hidratar a pele dos pacientes com cremes e curativos especiais, como filmes de poliuretano, que são colocados como forma de proteção e prevenção da úlcera por pressão. Todos são avaliados pela comissão de prevenção e tratamento de feridas do hospital, formada por enfermeiros especialistas.
Na instituição, o acompanhamento psicológico dos acamados varia de acordo com o estado psíquico e o enfrentamento da doença. “A enfermagem tem um papel fundamental nesse apoio. No diagnóstico já é possível avaliar a necessidade do tratamento. No caso de câncer, o serviço de psicologia é automaticamente acionado”, conta.
HUMANIZAÇÃO E CUIDADO INDIVIDUALIZADO
O banho no leito no Hospital e Maternidade Celso Pierro – PUC-Campinas (SP) é realizado com um kit composto por bacia, jarro, sabonete líquido, compressa de banho, toalha e luvas de procedimento. Os sabonetes, as luvas e as compressas são descartáveis; a bacia e jarro, submetidos à termodesinfecção.
A equipe de enfermagem separa todo o material necessário, orienta o paciente sobre o processo que será realizado e executa o banho conforme técnica normatizada na instituição. “Não se trata apenas de uma atividade para higiene corporal, mas também de uma ação terapêutica, pois estimula a circulação sanguínea, substituindo as atividades físicas, sendo, ainda, o momento ideal para realização do exame físico completo, pela observação e pelo toque de todo o corpo”, explicam Ana Luiza Ferreira Meres, diretora de Enfermagem, e Rachel Kiyomi Sugawara Prado de Oliveira, enfermeira executiva da Educação Continuada do hospital.
Elas aproveitam para sugerir ao mercado a criação de um guincho para mobilização dos pacientes acamados, que atuaria como um diferencial no posicionamento e minimizaria o esforço dos colaboradores envolvidos neste cuidado.
A higienização bucal se dá com clorexidina, espátula e gaze estéril. A técnica é um fator significante para a manutenção da saúde e o conforto dos pacientes. “No momento da internação, é importante a avaliação da cavidade oral para que a equipe possa estabelecer as metas e planejar a assistência. A higiene oral deve contemplar gengiva, palato, bochechas, língua e hidratação dos lábios”, descrevem Ana Luiza e Rachel.
A limpeza dos ouvidos é realizada através da fricção externa com a compressa de banho e, em casos específicos, com gaze úmida. A higienização íntima acontece segundo a necessidade do paciente acamado, com sabonete líquido, compressa de banho e jarro com água morna. “Posicionamos uma comadre na região sacral para facilitar o escoamento do líquido”, acrescentam.
O Hospital da PUC-Campinas tem preocupação especial com os pacientes com mobilidade reduzida, devido aos riscos a que estão submetidos. “Nosso projeto terapêutico é focado em ações para gerenciamento dos riscos e aumento do conforto. Os quartos possuem acessibilidade com portas compatíveis, banheiros com barras de segurança, acentos adequados, cadeiras de banho, camas elétricas e campainhas de fácil acesso”, contam.
O colchão utilizado é do tipo piramidal, e as roupas de camas são de acordo com a necessidade dos pacientes, com tecido macio e dobradura feita de forma a evitar as úlceras de pressão. Além de mudanças de decúbito, são utilizados cremes, óleo de girassol, curativos hidrocoloides e filme transparente para evitar esse problema.
Com relação às quedas, as profissionais explicam que a instituição participa da rede de hospitais acreditados ONA – Organização Nacional de Acreditação, cuja primícia é a gestão de risco assistencial. A queda é um evento não planejado que levou o paciente ao chão, podendo ser por fatores intrínsecos (alterações fisiológicas, psicológicas, patológicas e efeitos de medicações) e extrínsecos (meio ambiente, comportamento e atividade do indivíduo). O índice de queda em hospitais varia de acordo com a característica da instituição, de 1,4 a 13,0 para cada 1000 pacientes-dia, as lesões estão presentes entre 15% e 50% dos eventos. “Como medidas de prevenção, realizamos avaliação de risco para todos os pacientes, incentivamos a presença do acompanhante, mantemos os pertences e objetos próximos do alcance, utilizamos as grades das camas como barreiras físicas e adotamos o protocolo institucional de quedas.”
Ana Luiza e Rachel salientam que a instituição trabalha com os conceitos de humanização e cuidado individualizado. “O processo de enfermagem tem foco no atendimento das necessidades humanas e possuímos um serviço interno de ouvidoria para o atendimento dos pacientes e familiares”, finalizam.
CONEXÃO COM O PACIENTE
Desde a sua fundação, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, de São Paulo (SP), é reconhecido por seu modelo assistencial, o que marca sua vocação com o cuidado. Na instituição, o processo de banho no leito envolve um check-list com cerca de 25 itens. A preparação começa com a separação do material (toalhas, lençóis, luvas de banho, comadre, hamper, sabonete e produtos para higiene oral e couro cabeludo, se necessário), que é levado até o quarto do paciente, onde todo o procedimento é explicado. Depois disso, é feita a desinfecção da mesa de cabeceira, que é coberta com a toalha de rosto. Com o hamper próximo à cama, são retirados cobertores e colchas; e o paciente é coberto com o lençol. Antes de iniciar o processo, o profissional de enfermagem se paramenta com luvas de borracha. Quem explica é Fátima Silvana Furtado Gerolin, superintendente assistencial.
Para os pacientes em 1º pós-operatório (1º PO) cirúrgico na UTI, é utilizado lenço higienizador de algodão com surfactante e hidratante. Nos demais setores, ou para pacientes acima do 1º PO, o hospital usa jarro e bacia de inox, luva descartável, água e sabonete. Depois do banho, os jarros e as bacias passam pela termodesinfetora, são secos com toalha limpa e acondicionados no quarto do paciente. Após a alta, são retirados e encaminhados em saco plástico específico para a central de materiais.
Para a higiene do couro cabeludo, a equipe do hospital sugere ao mercado a criação de um dispositivo inflável para colocar embaixo do pescoço do paciente, com um reservatório para água.
Segundo Fátima, o banho de leito demora cerca de 15 a 30 minutos, sem levar em conta outros procedimentos, como curativos, massagem de conforto, etc. A atividade é praticada por dois profissionais.
No Oswaldo Cruz, os produtos utilizados na higienização bucal são: escova de dente macia ou espátula e gaze, creme dental ou solução antisséptica bucal, copo com água, toalha de rosto, cuba rim e luvas de procedimento. Se o paciente estiver intubado, são usadas pinça Pean e gaze estéril ou escova impregnada com clorexidina, considerando o uso de sugador ou material de aspiração.
Já a limpeza íntima é feita utilizando comadre, jarro ou balde de água morna, toalhas de banho e de rosto, travessa, fralda descartável (se necessário), luvas de banho umedecida com álcool 70% e hamper. O paciente precisa estar em posição decúbito dorsal, cobrindo a região genital com toalha de banho. A área deve ser seca com a toalha. Tanto esse processo quantos os outros já citados são sempre registrados no prontuário do paciente.
Para auxiliar no manuseio e movimentação do paciente, o hospital oferece, ainda, cadeira balança, guindaste, camas de última geração e transfer, entre outros. Nas camas, são utilizados colchões de ar para os pacientes com risco de úlceras por pressão. Os lençóis, na UTI, possuem um forro absorvente semelhante ao material da fralda descartável. Para evitar feridas ou outros problemas oriundos da mobilidade reduzida, a instituição usa creme de silicone, placas de hidrocoloide, pomada à base de Retinol, colecalciferol, óxido de zinco e óleo de fígado de bacalhau.
Os pacientes internados são classificados pela escala Morse como risco baixo, moderado ou alto de queda. Aqueles com risco moderado e alto recebem uma pulseira laranja e são adotadas medidas para evitar as quedas, como prescrição de cuidados de enfermagem, folder educativo, plano de educação, presença de acompanhante, protetores de grade da cama e apoio no vaso sanitário. Os pacientes externos são identificados com uma sinalização em forma de círculo laranja na pulseira.
Segundo a entrevistada, todos os quartos foram construídos e mobiliados para oferecer o maior conforto possível para o paciente, seus familiares e acompanhantes. A escolha dos móveis se deu de maneira minuciosa para minimizar os riscos de acidentes, com bordas arredondadas e estrutura reforçada para evitar quedas. A cor das paredes foi definida para transmitir tranquilidade, bem como toda a iluminação, disposição dos móveis, quadros e cortinas. Todos os quartos possuem um quadro com os nomes dos profissionais responsáveis pelo cuidado do paciente, o que vai ao encontro dos princípios preconizados no modelo assistencial da instituição, estimulando o internado e seu familiar a estabelecerem vínculo de confiança com os profissionais.
“Também oferecemos Unidades de Internação Premium onde o paciente e seus familiares contam com mais alguns itens, além daqueles já oferecidos pela instituição. Temos, ainda, uma Unidade de Cuidado Integrado Paciente e Família, para que o paciente de média e longa permanência e seu acompanhante possam realizar atividades diárias, como ioga, encontros com psicólogo para discussões de temas específicos, reflexologia, sarau, musicoterapia e oficina do bem-estar espiritual”, finaliza Fátima.